Província Jesus Bom Pastor - Caxias do Sul – Brasil
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Ir. Maria Brendalí Costa, sjbp
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Foto: Alberto Meneguzzi |
Na busca de alternativas para a geração de emprego e renda, o município de Caxias do Sul, em 1997, pensou o projeto Associação de Recicladores. A partir de então foram criadas várias associações na cidade de Caxias do Sul. Hoje são oito grupos que nasceram de uma política pública do governo municipal. Nossa presença de maneira incisiva, começou em 12 de junho de 2001, quando convidada para prestar assistência jurídica à Associação de Recicladores Interbairros. Depois de certo tempo, este trabalho foi assumido pela Igreja, como uma ação da Cáritas [1] através da assessoria na formação. Hoje o projeto quer responder à realidade e necessidades dos recicladores que já experimentam uma nova proposta empreendedora e solidária e encontram o desafio da coerência, numa economia globalizada, de articular em rede as organizações existentes, em vista de um projeto de desenvolvimento local integrado e sustentável que gere melhores condições de vida para a população atual e garanta a vida das próximas gerações. Dentro das associações que acompanhamos são vários projetos em andamento. Entre eles cito:
1º) Monitoramento às associações de recicladores É garantida a presença e monitoramento aos grupos. Tenta-se priorizar o acompanhamento às coordenações, em alguns momentos são feitos encontros com todo o grupo e também assembléias, quando necessário. Também há o acompanhamento individual a cada reciclador, através do diálogo e da escuta. Quando necessário se faz algum encaminhamento em nível de saúde, educação, tratamento de dependência química, assistência, etc. Na parte contábil e gerenciamento aos grupos contamos com a ajuda de mulheres recicladoras. A insistência constante é que: “Reciclador educa reciclador”.
2º) Curso de Informática Este Projeto foi construído para atender a necessidade dos próprios recicladores, seus filhos e as crianças dos bairros vizinhos, com uma parceria para fornecimento de equipamentos. A metodologia de trabalho é participativa com o objetivo de provocar a preparação de multiplicadores locais. Trabalha-se desta forma a auto-estima dos filhos de recicladores encarando a reciclagem como trabalho digno. Atualmente a educadora é uma jovem, filha de recicladora, que realizou o primeiro curso proposto. Este projeto muda o paradigma de concepção de que “eles os recicladores, são os excluídos que só devem receber” para uma concepção de que “eles, os recicladores, também têm algo para oferecer” à comunidade. São duas associações que contam com este projeto.
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Foto: Gilnei Fronza Educadora, crianças e adolescentes dos bairros vizinhos à Associação de Recicladores Interbairros na conclusão do curso de Informática |
2º) Projeto Retorno ao Estudo Acadêmico A proposta surgiu a partir da realidade e por provocação das associações de recicladores que pediam a oportunidade, para aqueles que queriam, de retornar aos estudos escolares, com o favorecimento e ajuda nos gastos. A dificuldade é perseverar no estudo iniciado, pois a maioria são mulheres, mães de famílias e com vários filhos pequenos. Todas estudam no período noturno e dependem de outros para cuidar de seus filhos. Além do cansaço pelo trabalho braçal realizado na Associação, também arriscam na falta de segurança, pois se locomovem de ônibus, tarde da noite, numa região muito violenta. Outro fator que impede a participação e a perseverança é o machismo e a mentalidade de que cuidar dos filhos e cuidar da casa é tarefa exclusiva da mulher. Então depois de trabalhar o dia todo na reciclagem, que é um serviço pesado, elas saem do serviço às 17:30 horas e vão para casa a pé (sendo que a distância é de mais de três quilômetros), depois em casa devem deixar a janta pronta, acomodar as crianças e se arrumar com rapidez para não perder o horário da aula. Sempre com a preocupação de ter deixado em casa os filhos sozinhos. Temos o exemplo de uma mulher que completou o primeiro e segundo grau e depois fez um curso técnico em contabilidade para ajudar as outras associações.
3º) Projeto “Associações a serviço da Comunidade” Foi elaborado um folder de divulgação e conscientização das comunidades para a correta seleção do lixo (matéria prima).
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Foto: Alberto Meneguzzi |
4º) Projeto alfabetização em conjunto com a Pastoral da Criança Houve uma solicitação das associações de recicladores (Interbairros, Jardim Glória de Bento Gonçalves e Serrano) de que retornasse o estudo dentro das associações. Foi solicitado de que os próprios recicladores fossem educadores dos recicladores. Este projeto é em parceria com a Pastoral da Criança, através do método de alfabetização básico, que é o método Paulo Freire. Em primeiro lugar são capacitados multiplicadores que depois são os educadores dos grupos. Cada grupo se organiza nos dias e horários para ter a aula, dentro da associação, no período de trabalho. No início da alfabetização em todas as Associações foi constada a dificuldade de enxergar (visão) para poder ler e escrever. Ocorreu a necessidade da consulta com um médico oftalmologista e o devido encaminhamento para a aquisição de óculos ou outro tipo de necessidade. Foi realizada a parceria com um médico especialista e com uma ótica, onde cada um teve a consulta gratuita. Para a aquisição dos óculos houve a participação financeira de cada reciclador e a cobertura com o recurso do projeto. Muito emocionante este processo de humanização e solidariedade. O trabalho de monitoramento a cada grupo, ocorre pela Pastoral da Criança, que acompanha os recicladores e também outros grupos na Diocese com um respeitável trabalho. Também, a formação e avaliação dos educadores estão sob sua responsabilidade. O projeto permitiu um avanço, principalmente na área de prestação de contas, controle de produção, coordenação das assembléias, nas várias associações onde o projeto de alfabetização ocorreu. Além é claro da leitura, da realização de cálculos.
5º) Orientação jurídica Na medida do possível e a partir das necessidades que vão ocorrendo é realizada orientação jurídica.
6º) Fundo Diocesano Cáritas para projetos de solidariedade. É um fundo organizado na Diocese, composto por 60% dos recursos da Coleta da Campanha da Fraternidade, realizada todo o ano, no domingo de Ramos. Este fundo ajudou vários projetos, visto estarem de acordo com o critério de grupos de geração de trabalho e renda: 1º) Associação de Recicladores Jardim Glória de Bento Gonçalves, solicitou ajuda para a aquisição de uma prensa enfardadeira, no valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais), nestas condições: 40% será repassado gratuitamente à Associação e a outra parte 60% deverá ser restituído ao Fundo. 2º) Associação de Recicladores do Bairro Serrano de Caxias do Sul, solicitou a aquisição de uma “Prensa enfardadeira de papel e plástico”. O recurso repassado foi de R$ 10.500,00 (dez mil e quinhentos reais), nestas condições: 50% será repassado gratuitamente à Associação e a outra parte 50% deverá ser restituído ao Fundo. 3º) Projeto Prensa da Associação de Recicladores Esperança de Bento Gonçalves - solicitando ajuda de R$ 12.000,00 (doze mil reais). Devolução de 50% no valor de R$ 6.000,00, a partir do mês de janeiro de 2006, com duzentos reais por mês. Tem nota em nome do Fundo. 4º) Resposta à solicitação de ajuda ao Projeto “Sala de computação” para a Associação de Recicladores Interbairros de Caxias do Sul – RS, no valor de R$ 2.950,00 (dois mil e novecentos e cinqüenta reais). 5º) Associação dos Recicladores Interbairros de Caxias do Sul solicitou ao Fundo Diocesano Cáritas uma ajuda em recursos financeiros no valor de R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), para aquisição de um moinho e um aglutinador para processamento do plástico. 6º) Associação dos Recicladores Jardim Glória, de Bento Gonçalves solicitou ajuda para a aquisição uma balança plataforma. O empréstimo foi de R$ 1.100,00 (um mil e cem reais) O Fundo fez a doação a título gratuito no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) e a Associação já devolveu os outros R$ 600,00 (seiscentos reais).
7º) Mulher Cidadã Eva Guedes da Silva recebeu no dia 11 de maio de 2005, uma homenagem da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul, sendo escolhida Mulher cidadã na cidade de Caxias do Sul, pelo gerenciamento de uma iniciativa alternativa de geração de trabalho e renda.
8º) Escola de Formação Fé, Política e Trabalho Neste ano de 2006 uma integrante de uma associação de recicladores está participando da escola.
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Foto: Alberto Meneguzzi |
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9º) Outras atividades - Acompanhamento a novos grupos de associações de recicladores em Caxias do Sul, com alcance em cidades que fazem parte da Diocese que estão em processo de organização. Também é dada ajuda a outros municípios e cidades que sentem esta necessidade e querem responder a este desafio. - Encontros do Fórum das Associações da cidade de Caxias com seus coordenadores e ou delegados; - Visita a outros projetos de reciclagem de lixo em nível de estado, de país e outros países; - Reuniões com entidades governamentais; - Formação específica em cada associação, principalmente para a separação correta dos materiais; - Acompanhamento individualizado às pessoas dos grupos, conversas, visitas; - Reuniões com entidades governamentais e não governamentais; - Processo de elaboração de novos estatutos e novos regimentos para as associações de Caxias e Bento Gonçalves: assembléias para explicação dos objetivos, da necessidade e as mudanças necessárias; - Articulação e acompanhamento de visitas às associações para conhecimento da realidade e conhecimento do projeto; - Celebramos e festejamos o Natal nas Associações. Antes realizamos uma avaliação participativa do trabalho, recuperando o sentido de uma mística cristã, que considera o respeito à dignidade da pessoa humana, não querendo fazer nenhum proselitismo com estes grupos que acompanhamos. - Empenho em pagar dívidas da construção do prédio da Associação de Recicladores Interbairros. - Tentativa de integração das ações governamentais do Projeto Fome Zero, através do Projeto Trabalho 10 Fome Zero que promove a capacitação técnica. - e outras atividades rotineiras.
O projeto existe, visto que em seu início contou com a ajuda e solidariedade de irmãos e irmãs da Itália, que conhecendo esta realidade, sensibilizados, organizaram a partilha. Também a Conferência Episcopal Italiana foi solidária com esta realidade. Esta parceria e intercâmbio ocorreram, através do empenho discreto de Pe. Antônio da Silva, nosso irmão Paulino e do professor Giovanni Battista Montironi, amigo de fé, indignado pela injustiça e não distribuição. Posso afirmar que em meio a esta realidade de extrema miséria, através da reciclagem de lixo, encontro e enxergo Deus. Minha vida está sendo reciclada. Esta experiência continua reciclando vidas...
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Foto: Alberto Meneguzzi |
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Coordenação Diocesana de Pastoral |
Notas [1] A Cáritas é um organismo de pastoral social e de assistência social da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, criado em 1956. A Cáritas faz parte de uma rede mundial que atua em 198 países. No Brasil, sua atuação acontece de maneira descentralizada em nove regiões. Trata-se de uma rede de pessoas solidárias que trabalham de forma organizada junto aos empobrecidos, motivados pela mística cristã.
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